quinta-feira, novembro 27, 2008


Do rapto inesperado

como pode ser em tudo e menos nós
a flor a demais algoz
dos devaneios desdenhosos
estancados, duros
cravados em pedra-lioz?

Como pode em tão doce apreço
revelar-se a lumnescência
de um quadro escabriado
em tons de sombra?

em segmentos de frases
as ânsias se alinham às margens do improvável
imprevisível
pra realizarem-se no ponto do inexorável
indivisível

pra encontrar casa nos teus braços
pra me enxergar em fim no teu olhar
pra me amarrar no teu laço
pra ceder tolo ao teu sorriso
que me toma...
me contamina o ar
arranca os grilhões fransinos
chumbados do ador da solidão

e por estranho
não me é estanque
já somos um com a graça da companhia certa
com um dedo a mais de confiança sincera
que não me faz das lamúria, o banho
e irradia na dança do vento
o rapto de mim
decerto irrevogável
na alegria calma e discreta
na paixão irreparável...

quarta-feira, novembro 26, 2008


O Mais é Nada - Autor Desconhecido
não costumo citar, mas esse...

“Navegue, descubra tesouros, mas não os tire do fundo do mar, o lugar deles é lá.
Admire a lua, sonhe com ela, mas não queira trazê-la para a terra.
Curta o sol, se deixe acariciar por ele, mas lembre-se que o seu calor é para todos.
Sonhe com as estrelas, apenas sonhe, elas só podem brilhar no céu.
Não tente deter o vento, ele precisa correr por toda parte, ele tem pressa de chegar sabe-se lá onde.
Não apare a chuva, ela quer cair e molhar muitos rostos, não pode molhar só o seu.
As lágrimas? Não as seque, elas precisam correr na minha, na sua, em todas as faces.
O sorriso! Esse você deve segurar, não deixe-o ir embora, agarre-o!
(...)

Não importa se a estação do ano muda, se o século vira e se o milênio é outro, se a idade aumenta;
conserve a vontade de viver, não se chega à parte alguma sem ela.
Abra todas as janelas que encontrar e as portas também.
Persiga um sonho, mas não deixe ele viver sozinho.
Alimente sua alma com amor, cure suas feridas com carinho.
Descubra-se todos os dias, deixe-se levar pelas vontades, mas não enlouqueça por elas.

Procure, sempre procure o fim de uma história, seja ela qual for.
Dê um sorriso para quem esqueceu como se faz isso.
Acelere seus pensamentos, mas não permita que eles te consumam.
Olhe para o lado, alguém precisa de você.
Abasteça seu coração de fé, não a perca nunca.
Mergulhe de cabeça nos seus desejos e satisfaça-os.
Agonize de dor por um amigo, só saia dessa agonia se conseguir tirá-lo também.
Procure os seus caminhos, mas não magoe ninguém nessa procura.
Arrependa-se, volte atrás, peça perdão!

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudades, mate-a.
Se perder um amor, não se perca!
Se achá-lo, segure-o!


“Circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. O mais é nada”
.
Fernando Pessoa


- Pára!
- O que foi?
- Me beija.
- Deixa de besteira, menino... – ela puxa-o pelo braço.
- Besteira? Me beija.
- Pára, por favor, ta todo mundo olhando.
Ele ri.
- Deixa olharem... – olha pra ela em silêncio – Tu não entendes, né? – ela olha enrubescida, com ar de dúvida – Eu não estou aqui por causa deles... Estou aqui por tua causa.
- Mas estamos no meio de uma praça e já ta pra chover. – insiste ela tentando se convencer que sua eloqüência iria dissuadi-lo.
- Deixa o mundo, as pessoas. Que olhem... Que molhe. Vê? Estou vivo, novo, nulo, despido, por mim, por ti, por tudo... Sou eu, aqui. Não vou ousar deixar que te roubes o sabor do presente comigo. Não é de beijo que morre o mundo, ou falece tuas certezas. Te entrega na possibilidade de sorrir por algo novo, muito além das fronteiras que criaste pra ti até agora. – ele respira. Olha pra ela com um encantamento gracioso. Ela não entende... Dá-se à um tento de raiva ao pensar dele como sendo exagerado. - Nem sei quais são essas fronteiras. Não as tenho, porque larguei-as quando te vi. Soltei as amarras pra me jogar nos teus braços. É o que te peço agora, te entrega pra mim... me beija.
Ela irrompe a discussão e num ímpeto apressado, lhe entrega o beijo. Dado.
- Pronto – diz. E continua a puxá-lo
- Não... Não quero só tua boca. Te quero inteira! Quero que te jogues nos meus braços; quero teu corpo, tuas querelas, tua perdição; quero que te deites comigo aqui e agora!
- Tu só podes ser doido...
- Deita ali na grama comigo.
-Ta suja.
- A gente lava!
- Vai chover.
- A gente se molha!
- Ai... Pára, por favor. Vamos! – ela puxa-o pelo braço. Ele não vai. Fica parado.
- Eu não tenho lugar pra ir. Eu estou aqui. Pra resolver tua cabeça, eu sei te explicar de tudo... Da limitação do momento, da previsibilidade da paixão, da finitude da empolgação, do fim do espaço, do começo do tempo, do peso do amargo, das dúvidas das mágoas, do ardor de todos os problemas... Do limite de qualquer declaração vívida... Eu sei. Eu sei do medo. Eu não sou isso. Não sou o medo, não sou a preocupação com as limitações. Sou o fulgor inebriante do toque da tua pele; o arrepio que me causa o teu sorriso, a calma tenra do teu olhar... Sedento de carinho, de revelação, de claridade, pedindo pra escancarar o que borbulha aí dentro. Sou o relógio sem ponteiros, a quase loucura que recria a vontade de acreditar em mim, em ti, em nós... Juntos. Como poucas vezes fui e foste. Juntos... Num só sorriso. – ele faz uma pausa. Pega na mão dela e diz – Não vem me falar dos limites... Larguei-os lá no início quando as janelas começaram a pular. Estou aqui pra me ver no teu olhar, no rubor do teu rosto quando eu falo o que queres ouvir – ela enrubesce – Ta vendo! - diz ele – deita na grama comigo? A gente faz amor se olhando, num beijo, num abraço que me faz casa teu casulo, tua pele doce e tua rosa orvalhada...
- Quê?!
- Fecha a porta do passado e de tudo o que não somos nós... Anda! Ousa, vai... Te lança na escuridão que somos na potência de realização do que pretendemos...
- As coisas não funcionam assim...
- As coisas funcionam? O que funciona nessa doideira de mundo? Não funcionam... Meu coração, me desculpa, não funciona. Ele pára toda vez que te vê. Toda vez que de soltas mais nos meus paparicos, nos meus sorrisos.
- Tá! E depois? Isso é o início. É sempre assim eu quero ver depois.
- É o início. É pra ser o início, não? Quer começar pelo fim... Depois não existe. Não sou o amanhã, sou o agora. E a minha vida já passou demais pra ficar nessa preocupação. Não temos tempo. O sempre é o agora, o hoje. O depois é ânsia de perpetuação do sorriso que temos um com o outro.
- Entendeste o que eu quis dizer...
- Entendi. E ainda sim, te afirmo, olhando nos teus olhos, segurando a tua mão, na praça prestes a chover, que sou mais do que isso, e podemos muito mais juntos. Não quero entrar num quadrado, quero a roda-gigante, o parque de diversões, o abraço nervoso, o carinho real e vivo. Deixa eu velar o teu sono. Te assistir dormir, pra acordares enrubescida, pensando mil bobagens. O tempo nem existe e nosso relógio parou desde sempre.
Silêncio. Ele continua a olhá-la. Com o mesmo carinho de outrora, com a mesma vontade de abraçá-la.
-Deita na grama comigo?